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Identificação Humana
pelo DNA: Genética Forense
Capítulo V
INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE
1. Índice e probabilidade de paternidade
O que observamos nas auto-radiografias ou na análise do peso das bandas (kb), tanto nos testes de minissatélites como nos de microssatélites, é a existência, no filho, da banda (ou alelo) de origem materna (idêntica a uma das de sua mãe). A outra banda presente deverá ser de origem paterna e idêntica à presente no DNA do investigado. A existência de banda diferente de uma das paternas denota uma exclusão que deverá ser confirmada por outra sonda.
Quando o possível pai não é excluído, calcula-se o índice de paternidade, a probabilidade positiva de paternidade para cada sonda e a probabilidade positiva cumulativa de paternidade dos diversos testes (Walker, 1995).
O índice de paternidade (IP) reflete a razão entre a probabilidade de que um homem com o fenótipo do possível pai (homem analisado), seja o pai biológico da criança, e a probabilidade de que outro homem, ao acaso, possa ser o verdadeiro pai.
Esse índice é expresso pela fórmula: X/Y, onde:
X = a probabilidade de que o homem com o fenótipo do possível pai analisado, possa ter produzido o espermatozóide que carrega o gene (alelo) obrigatório de origem paterna. X é a freqüência do gameta, sendo 1 para os homozigotos e 0,5 para os heterozigotos;
Y = a probabilidade de que outro homem, ao acaso, possa ter produzido dito espermatozóide. Y é o percentual do alelo paterno na população.
Na realidade, o cálculo acima é uma simplificação da fórmula do IP, pois ela pode ser explicada como:
X =probabilidade de transmissão do alelo materno (M) x probabilidade de transmissão do alelo obrigatório paterno (P);
Y =probabilidade de transmissão do alelo materno (M) x freqüência do alelo paterno na população de mesma raça. As probabilidades de transmissão dos alelos M e P são de 1 para homozigotos e 0,5 para heterozigotos.
A simplificação anula a probabilidade M do numerador e do denominador, denominando-se X, simplesmente a probabilidade de transmissão do alelo paterno (P) e Y a freqüência do alelo paterno no banco de dados.
Devemos calcular o IP para cada loco analisado, sendo que a multiplicação de um índice pelo outro permite o cálculo do índice cumulativo de paternidade (ICP). Quanto maior o ICP, maior a probabilidade de o investigado ser o pai biológico.
A probabilidade cumulativa de paternidade é calculada a partir do ICP, levando-se em conta a probabilidade “ a priori” de paternidade (PP), decorrente de outras evidências (não genéticas), anteriores ao estudo pericial. No cálculo estatístico, é obrigatório o uso de uma probabilidade “ a priori” . Como os peritos desconhecem essas evidências e devem permanecer neutros na disputa, utilizam o valor médio de 0,5 ou 50% em seus cálculos, para que não exista tendência matemática prévia a favor ou contra a paternidade. Essa probabilidade “ a priori” é utilizada por todos os peritos em nível internacional.
A fórmula para calcular a probabilidade cumulativa de paternidade (W) é:
Os testes de DNA costumam proporcionar probabilidades cumulativas positivas de paternidade acima de 99,9%.
Internacionalmente, aceitam-se, como provável paternidade, probabilidades de 90-94,9%; como forte indício de paternidade, entre 95-99%; e paternidade praticamente certa, acima de 99%.
A probabilidade de exclusão de um homem, acusado falsamente, é próxima a 100% para a combinação de diversas sondas moleculares.
Informações mais detalhadas estarão disponíveis no capítulo VI “Matemática Forense”.
2. Colheita de sangue, identificação das partes e confirmação de exclusões
Figura 1 - Colheita de amostra de sangue. Figura 2 - Colheita de amostra de Swab Bucal.
As amostras de sangue (figura 1) ou swab bucal (figura 2) devem ser colhidas individualmente, sendo importante que as partes compareçam no mesmo horário, pois assim uma identifica a outra (veja capítulo XI).
Em casos em que, por algum motivo, as partes não possam comparecer no mesmo horário, o investigado pode ser fotografado e sua foto incorporada ao laudo, como prova de sua identidade. Outra possibilidade seria a utilização de fotocópia de documento oficial.
Quando as amostras chegam ao laboratório, um dos tubos com sangue de cada indivíduo será congelado, outro servirá para a realização dos testes de DNA. Esses testes podem ser realizados por equipes diferentes e analisados pelo perito. Sempre que existir exclusão de paternidade, repete-se a análise com a amostra que tinha sido congelada. Dessa maneira, todas as exclusões são confirmadas.
Leitura mais detalhada será encontrada no capítulo XI “Métodos de Colheita de Material Biológico”.
3. Antecipação de prova genética e banco de DNA
Algumas pessoas solicitam o estudo de suas características imunogenéticas, procurando deixar documentada, em forma de laudo médico, sua individualidade molecular. Os estudos podem ser os de perfil do DNA de STR. Uma amostra de DNA extraída de suas células é congelada a - 80°C para futuro estudo comparativo, caso necessário. Dessa maneira, a família fica com a certeza de poder confrontar estes resultados e utilizar o DNA estocado em futuras ações de investigação de paternidade, surgidas após a morte do solicitante.
Em casos de estupro, é possível também o congelamento do DNA vaginal, extraído após a violação, permitindo realizar o estudo comparativo com o DNA do suspeito, quando este for capturado.
4. Investigação de paternidade com o trio mãe, filho e possível pai
Estes casos são os mais comuns em um serviço especializado em perícias genéticas, sendo os de mais fácil resolução, embora possam existir fatores extras que aumentem a dificuldade (Figs. 3, 4, 5 e 6). Esses casos são todos resolvidos em laboratório qualificado, pois o leque de marcadores genéticos, disponíveis para a análise, é tão grande que fica impossível a falta de conclusão.
Figura 3 - Inclusão de paternidade (RFLP) com sondas MS1, MS31, MS43 e MS621. Na coluna 1, 2 e 3 observam-se as bandas de DNA da mãe, do filho e do suposto pai, respectivamente. Facilmente detectamos as bandas maternas(M), presentes no filho, sendo que as bandas paternas (P) estão também presentes no investigado. Os marcadores de peso molecular encontram-se nas laterais.
Figura 4 - Inclusão de paternidade (STRs) com a sondas D3S1358, vWA31 e FGA, utilizando a amplificação dos locos de STR pelo método de PCR – kit Profiler Plus -ABI e análise por seqüenciador automático (ABI 310). Identificamos que o filho (NS) herdou alelos de sua mãe (FG) (alelo 15 no loco D3S1358; alelo 16 no vWA31 e 24 no FGA), sendo que os demais (18, 17 e 21 respectivamente) são de origem paterna e também existentes no suposto pai (AS). Outros 10 locos foram também analisados sem que se encontrasse uma única exclusão de paternidade.
Figura 5 - Exclusão de paternidade (RFLP) com sondas MS31, MS43, MS205 e G3 (RFLP). Na coluna 1, 2, e 3, observam-se as bandas de DNA da mãe, do filho e do suposto pai, respectivamente. Facilmente detectamos as bandas maternas (M), presentes no filho, sendo que as demais são obrigatoriamente de origem paterna. O investigado não apresenta essas últimas. A coluna 4 representa a mistura do DNA do filho e do suposto pai. O marcador de peso molecular encontra-se na lateral esquerda.
Figura 6 - Exclusão de paternidade utilizando-se os STR. Verticalmente podemos observar os resultados dos locos D8S1179, D21S11 e D18S51. No loco D21S11, o filho apresenta o alelo 31 em comum com sua mãe, sendo
que o loco 28 será obrigatoriamente de origem paterna. O suposto pai não apresenta esse alelo, mas sim o 29 e 30. Outra exclusão pode ser identificada no loco D18S51, no qual o filho herdou o alelo 13 de sua mãe, sendo que o 14 é de origem paterna. O suposto pai não apresenta esse alelo, mas o 18 e 21.
5. Investigação de paternidade ou de maternidade com a presença do filho e de um dos supostos pais (duos)
Na impossibilidade de estudar a mãe, é possível realizar as provas de DNA entre o suposto filho e o possível pai, sendo os resultados estatísticos bastante confiáveis. Observaremos metade dos alelos em comum entre o autor e o investigado. Caso não se observem alelos em comum, estaremos frente a uma exclusão. O estudo de maternidade acontece da mesma maneira (Fig. 7).
A identificação do perfil genético dos STR do cromossomo Y permite também excluir pais falsamente acusados, no entanto o mesmo perfil entre filho e suposto pai não assegura a paternidade, mas somente informa que pertencem à mesma linhagem masculina do cromossomo Y.
Figura 7 - Investigação de maternidade entre filha e suposta mãe pelos STR, usando o kit Profiler Plus e seqüenciador ABI 310 (Applied Biosystems, USA). É possível a identificação do sexo feminino das participantes pelo teste da amelogenina (X), assim como a inclusão da maternidade, pois em cada loco existe sempre um alelo em comum entre as duas. Outros 12 locos foram analisados sem nenhuma exclusão.
6. Troca de crianças na maternidade
A troca de recém-nascidos pode ser facilmente solucionada pelos testes de DNA. Na Fig. 8, podemos observar a conclusão de caso em que a identificação da troca de crianças aconteceu após sete anos dos nascimentos.
Figura 8 - Investigação de troca em maternidade. Na coluna 1, pode-se observar o DNA de uma das crianças analisado com as sondas unilocais ( RFLP ) MS205, MS1, MS31 e G3. Na coluna 2, o DNA de uma das mães, casada com o possível pai com DNA presente na coluna 4. Na coluna 3, encontramos o DNA da mãe verdadeira, que não estava de posse da criança, podendo-se facilmente observar que uma das suas bandas está sempre presente na criança (coluna 1). O possível pai (coluna 4) e sua esposa (coluna 2) foram excluídos da paternidade e da maternidade por não apresentarem alelos ou bandas de DNA em comum com a criança (coluna 1). A probabilidade de maternidade para a mãe da coluna 3 foi de 99,9%. A outra criança estava desaparecida.
7. Investigação de paternidade com possível pai falecido
Nesta situação, existem duas possibilidades: ou examinamos os ascendentes e descendentes do falecido com um número adequado de testes genéticos (minissatélites e ou microssatélites do DNA, HLA), ou partimos para exumação do corpo do suposto pai e análise comparativa com o sangue do autor e sua mãe, se existente. Várias possibilidades existem para estudarmos as famílias:
7.1 Ambos os possíveis avós paternos são disponíveis
Nesta situação, os resultados são como se o falecido estivesse vivo, pois os alelos de origem paterna, existente no pretenso filho, devem obrigatoriamente estar presentes no avô ou na avó (Fig. 9 e 10); caso contrário, estaremos frente a uma exclusão. A inclusão é fácil de ser detectada e fornece resultados estatisticamente importantes.
Figura 9 - Investigação de paternidade com possível pai falecido (minissatélites – RFLP).
Na Figura 9 observamos um caso pericial em que o possível pai é falecido, tendo-se estudado a mãe (coluna1), o filho (coluna 2), o possível avô e avó paternos (coluna 3 e 4). Utilizamos sondas unilocais MS1, MS31, MS43 e MS205 que detectam os locos de DNA, conhecidos como minissatélites. Pode-se observar com facilidade que o filho (autor) apresenta alelos (bandas) de DNA de origem materna (M) e que suas bandas de
origem paterna (P) estão sempre representadas na possível avó paterna (coluna 4).
De acordo com a localização destas bandas, digitalizadas eletronicamente, em estudo comparativo com o DNA controle (laterais), pode-se determinar por software
especial o peso em kilobases (kb) de cada alelo de DNA. A utilização de dados de freqüência dessas bandas na população, permite a seguinte conclusão para este caso: o possível pai (falecido) não pode ser excluído da paternidade do autor. A probabilidade cumulativa positiva
de paternidade é 99,91%, e o índice de paternidade é de 1.150.
Figura 10 - Investigação de paternidade com possível pai falecido e análise comparativa com os avós paternos, usando os STR ( Identifiler ). Podemos observar na vertical os locos D19S433, vWA31, TPOX e D18S51. Os resultados mostram a inclusão de paternidade, sendo que outros 12 locos demonstraram o mesmo padrão de alelos paternos do autor, presentes ora na avó, ora no avô. O autor herdou os alelos 14 (loco D19S433), 17 (vWA31), 8 (TPOX) e 12 (D18S51) de sua mãe, sendo que os alelos 13, 18, 8 (homozigose) e 18 respectivamente são de origem paterna e presentes entre os alelos dos avós.
8. Filhos do investigado, viúva e irmãos
Na situação da não existência de ambos avós, poderemos realizar a perícia com os filhos legítimos ou até irmãos do possível pai (Fig. 11). Quando os filhos legítimos são analisados, é importante o estudo da sua mãe e da viúva do investigado (se existentes). A participação da mãe do autor é sempre desejada (em qualquer perícia), embora possamos realizá-la sem a sua presença. Os juízes devem solicitar a presença destas últimas, caso sejam vivas.
Entre irmãos, só poderemos observar o máximo de quatro alelos ou bandas diferentes de DNA (duas de origem materna e duas paternas). A exclusão de paternidade, pela análise dos irmãos do investigado falecido (supostos tios), utiliza esta regra, sendo impossível a presença de mais de quatro alelos diferentes entre os irmãos e o alelo paterno do autor.
No caso de análise da viúva e seus filhos (supostos meios irmãos), a exclusão acontecerá quando os dois alelos paternos forem identificados nos filhos do falecido, sendo diferentes dos presentes no autor (Fig. 12).
A maioria destes casos são resolvidos, dependendo da quantidade de participantes do lado do investigado falecido. A probabilidade de conclusão é proporcional ao número de filhos ou tios analisados. É necessário o conhecimento de que estamos reconstituindo o DNA de uma pessoa que não está presente, existindo a chance de que o alelo paterno presente no autor não seja o mesmo existente nos supostos irmãos. Dessa maneira, é sempre desejável que sejam estudados o maior número de descendentes ou ascendentes do suposto pai e a viúva (se existente).
Figura 11 - Investigado falecido. Nas colunas 1, 2, 3, 4, 5 e 6, observam-se as amostras de DNA da mãe, filho (autor), viúva e seus três filhos com o falecido. Nota-se facilmente a banda materna (M), presente no autor, sendo que a banda (P) é de origem paterna, e também encontrada entre as de origem paterna dos filhos da viúva com o investigado.
Figura 12 - Investigado falecido (exclusão de paternidade). Análise da autora, viúva e dois de seus filhos com o suposto pai falecido. A exclusão se identifica no loco D21S11 pelo qual a viúva transmite o alelo 31,2 a sua filha, sendo que esta apresenta o alelo paterno 31, inexistente na autora, que apresenta os alelos 30 e 33,2. No mesmo loco, a viúva transmite o alelo 29 para seu filho, sendo que este apresenta o alelo 28 de origem paterna e inexistente na autora.
OUTROS MÓDULOS DESTE CAPÍTULO:
9. Inclusão de paternidade pelo DNA do Y
10. Exclusão de paternidade pelo DNA do Y
11. Identificação de Sadan Hussein pela análise do DNA do cromossomo Y
12. Exumação
13. Casos Especiais
13.2. Identificação de indivíduo carbonizado em acidente de automóvel
13.3. Investigação de paternidade pela análise de tecido fetal e cabelos do possível pai
13.4 . Identificação humana pelo DNA extraído de escova de dente
14. Resultados de 6.000 Casos Periciais